domingo, 31 de outubro de 2010

A fé não costuma faiá!

31 de outubro de 2010

Meu Bahêa continua ganhando fora de casa e agora está colado no Coritiba. Jogaremos contra eles na terça, casa cheia, e eu aqui. Podemos ser líderes Biu!!!!! Torça por mim também no caldeirão! E olha a estrela de prata pintando na área!!!!!
Apesar do processo eleitoral morno, hoje o Brasil pode ter a sua primeira presidente mulher (não é “presidenta” gente, por favor). Ou dizer não a mais uma fase de continuismo. Essa hipótese acho menos provável acontecer. Meu Deus, quantos momentos históricos na minha terra, e como é grande a minha vontade de participar fisicamente disso. Mas como diz Cissa, alguma questão eu precisava resolver em Angola, mais precisamente em Mbanza Kongo.
Ok, volta para a realidade Heitor!  Você não está em Salvador, está em Mbanza Kongo.
A semana aqui passou tranquilo. O trabalho e as tantas coisas para arrumar não deram espaço para uma análise mais apurada sobre a cidade, sua estrutura, seu funcionamento. Mas o final de semana bastou para eu chegar a algumas constatações.
Primeiro descobri que não falta luz todo o dia como eu pensava. Ou melhor falta. Mas é esperado, calculado. Aqui tem fornecimento de energia, mas vem de gerador. E quando acaba o diesel, falta luz até o responsável pela Coelba daqui trocar de gerador (são três). Só que as coisas e as pessoas daqui têm um jeito meio pojucano de ser. As vezes o cara dorme, as vezes dá uma saidinha. Aí você fica no escuro até ele voltar. Que negócio! A Coelba de Mbanza Kongo fica bem do lado do hotel onde estou morando por enquanto. Aliás, aqui só tem esse. Ouço o tempo todo o barulho do gerador iluminando a cidade. Quando não ouço, faltou luz. Genial!
Por falar no Hotel Estrela do Kongo, preciso apontar algumas curiosidades. Logo na fachada tem um letreiro com o nome do equipamento turístico e duas estrelas, não sei quem perdeu elas aqui. Ainda bem que não são as do Bahia!!!!! Só o impacto da falta de luz já gera uns desconfortos – o ar condicionado desconfigura, a antena parabólica desconfigura. Agora, por exemplo, estamos sem Globo e sem Record. Não posso ver ao vivo o resultado das eleições. Se a internet continuar boa, ótimo. Caso contrário, vou dormir com um presidente e acordar sem saber quem vai capitanear o Brasil.... chato isso. Mas estou na África.
Me colocaram no térreo, no quarto 8. Henrique está no 9 e Cleber pediu para ficar no piso de cima, no 21. São 10 em baixo, 12 em cima. Na primeira noite, escrevia para o blog e um calunguinha entrou por debaixo da porta. Botei ele para correr. Henrique disse que ele passou lá também. Pedi para subir no outro dia. Nunca tive medo de rato, mas tomo cada susto da porra! Odeio susto! Cissa também tem pavor de susto. Subi. Aqui em cima a porta é mais rente ao chão.
Meu colega Henrique disse que todo dia o rato vai lá! E come tudo que fica fora da geladeira! Ontem estava em cima da mesa, no teclado do notebook. Deveria estar teclando com algum colega, em algum lugar do mundo. Talvez o Mickey..... ou o Super Mouse.... Quando falei para o gerente ele disse: “professor, colocamos veneno, mas estamos em comunidade! Estamos a matar tantos, mas muitos outros aparecem cá! Não há jeito para esses ratinhos, ya!”. Lógica angolana.  Quem já teve o prazer de se hospedar no Hotel Pena, a estrutura daqui é um pouquinho melhor.

O hotel
Hoje acordei, tomei o pequeno almoço, ou mata bicho (café da manhã), calcei o tênis e fui para a rua. Queria corrrer, mas estava muito quente e preferi caminhar. Fui de um lado a outro da rua principal. Mbanza Kongo tem uma parte muito pobre que fica em um vale lindo, que ainda conserva muito verde. Mas a paisagem já começa a dividir espaço com o vermelho do massapê e das casas de adobe, que são tijolos grandes, feitos artesanalmente e localmente com a própria argila vermelha. Tudo desordenado. Subindo uma das ladeiras de barro, se chega a parte urbanizada, em cima de um morro. Cissa e Kau podem visualizar fácil – a periferia está em um espaço como o Vale do Paty, em um buraco, e os Gerais do Vieira seriam a área arrumadinha da cidade, no alto.

O vale

Pois bem, essa rua larga, de pista dupla, com um canteiro no meio, vai do mercado Nosso Super até o prédio da prefeitura, que fica em frente à governadoria. Nosso Super é uma rede nacional, era gerida pela Odebrecht. Mas agora é da filha do presidente. A família é dona de quase tudo aqui. Semelhanças não são mera coincidência. O poder é degrau para a fortuna em muitos lugares, não podemos criticar, nossa história também tem “rabo preso”.
Na frente do prédio onde o governador trabalha tem um busto de Agostinho Neto, figura política importante, primeiro presidente, e duas fontes com bonitas esculturas de mulheres. As fontes estão sem água.
Entre uma ponta e outra tem bancos, uma praça com um monumento aos heróis da guerra, o hotel, uma igreja católica grande, uma Batista, uma Universal, Corpo de Bombeiros. Tem um clube bem grande, que parece ser legal. Será reinaugurado em 11 de novembro, dia da independência, após muitos anos fechados por conta da guerra. Estava destruído, mas os chineses estão a todo gás na obra. Também tem muitos prédios públicos, acho que quase todos. Angola Telecom, Departamento de imigração, comando da polícia, a Coelba e a Embasa de Angola.
Na rua principal tem a ruína da primeira igreja católica da África, parte do patrimônio histórico e cultural tombado recentemente pela Unesco. Descobri que o Papa João Paulo II esteve em Mbnza Kongo. Ele deve ter vindo de avião. De Papamóvel ele não veio! Essa ruína fica no mesmo sítio histórico onde estão sepultados os reis e o imperador do Congo. Hoje inclusive tinha uma equipe de TV espanhola gravando um documentário lá.
Patrimônio histórico cultural UNESCO
O aeroporto está na rua de trás. Onde também está a nossa casa. Defronte fica a casa do governador. Segurança total. Essa via paralela à principal tem muitas residências oficiais e civis. Fica também a Universidade.
Governadoria
Aqui não tem violência. Não tem assalto, não tem pedinte. Os carros ficam com vidros abertos na rua. As pessoas se cumprimentam quando cruzam com outras pela rua.  Típico de uma cidade pequena.
Mas uma coisa me chamou muito a atenção hoje. A religiosidade dessa gente é uma coisa impressionante. A igreja católica tava socada. Estava tendo primeira comunhão. Os mais velhos estavam lindos! Um turbilhão de cores, muito bonito de se ver. Cantos estilo“capela” na missa e fora da igreja atabaques e agogôs me pareceram tão familiares! Mas eles cantavam e dançavam regidos pela fé católica. A “lenda” vai cair por terra. Ou pelo menos parte dela. Vocês vão ver. A história não é bem assim como contam aí. Faltam poucas peças.
O legal é que a igreja católica é vizinha, colada com a batista. As cores também estavam nas roupas daquelas pessoas. O que me chamou a atenção foi a placa na entrada que dizia: “Culto dominical – 10h em Kikongo, 11h em Português”. Kikongo é a língua nacional do norte de Angola, falada nas províncias de Cabinda, Zaire e Uige. Os hinos em Kikongo emocionam. O coral é um espetáculo. Como diz um conhecido, domingo que vem “vou botar uma calça comprida” e vou assistr ao show.
A Universal, com todo respeito, foi onde senti mais frieza. Mas também não parei muito tempo para observar.
Mas independente da crença, deu para perceber que a religiosidade está aqui. E o povo vive isso intensamente. Cada um na sua. Pelo menos por intolerância religiosa não se briga em Mbanza Kongo.

sábado, 30 de outubro de 2010

Gigante sagrado!

30 de outubro de 2010
A conversa de hoje encabeçava a lista de temas que tenho para o nosso blog. Só que era preciso pesquisar, conversar, aprofundar. Aproveitei o sábado e finalizei o trabalho.
Quando botei o pé em Angola, mesmo em Luanda, a primeira coisa que me chamou a atenção na paisagem foram os Baobás. Muitos deles. Chegou a hora de falar sobre o Imbondeiro, a árvore símbolo de Angola. E ela não é só símbolo. Para esse povo ela é sagrada.

Sua Majestade, o Baobá Africano

Em “O Pequeno Príncipe”, Saint Exupéry incluíu o Imbondeiro. Já faz tempo que li o clássico, mas ele está lá! Se você não vir um Imbondeiro ao vivo não faz ideia da grandiosidade dessa árvore. Elas são enormes!!!! Os troncos são muito grossos embaixo e afinam mais para o alto. Definitivamente é uma árvore diferente.
Gigante
Nas minhas pesquisas descobri muitas curiosidades. Somente a Sequóia e o Cedro Japonês podem disputar com ela no quesito longevidade. Seis mil anos!!!! Incrível um ser sobreviver tanto tempo!! 
Tudo no Baobá Africano pode ser aproveitado:
As crateras abertas no seu do tronco, armazenam água, servem como depósitos de cereais e até de sepulturas.
As raízes são usadas para extração de um corante vermelho, para tingir cerâmicas, madeiras e tecidos.
A casca retirada do tronco produz fibras que servem para a fazer cordas e tecidos bem grossos.
O fruto do Baobá se chama múcua, lembra um cacau na forma. Quem já provou diz que o seu suco é uma delícia, o sabor é parecido com o  tamarindo.  A polpa dos frutos seca produz uma farinha rica em vitaminas C e do complexo B.
Como as folhas são ricas em cálcio, ferro, proteínas e lípidos, são usadas como medicamento, para diarréia, febre e inflamações. Essas folhas secas e moídas são utilizadas contra anemia, raquitismo, reumatismo e asma.
Até a casca da múcua é aproveitada como tigela.
Múcua, fruto do imbondeiro
Achei interessante a floração do imbondeiro – acontece em uma única noite e dizem que não tem um cheiro bom. O seu néctar atrai morcegos que se encarregam de fazer a polinização. Vejam a importância e a responsabilidade desse bicho nojento. Garantir a  reprodução e perpetuação de um ser que vive seis mil anos!!!!!!  
E as sementes, riquíssimas em óleo vegetal, depois de assadas e moídas, servem para preparar uma bebida que é consumida como café.
Cortar um Baobá é sacrilégio em Angola. Por isso não se usa a madeira com frequência. Mas quando é inevitável, a madeira é aproveitada na carpintaria e fabricação de instrumentos musicais.
Uma árvore que vence seis milênios, tem tempo, muito tempo para construir uma relação diferente com tudo o que a cerca. Em algumas localidades de Angola, o Baobá é a ligação entre Deus e os homens, é Sagrada.
Como diria Robin “Santa ignorância Batman!!!”. Na Cidade da Luz, pertinho da minha, casa tem um baobá jovem. Tem uns cinco anos ainda. Medrado fala que ela é a árvore sagrada do candomblé. Na Escola Carlos Murion, onde trabalhei um tempo, e onde ele foi plantado, todo mundo repete isso. E não é isso!!!! O imbondeiro é a árvore sagrada de um povo inteiro, independente das suas crenças.
É preciso correr o mundo. Não tem jeito. A pessoa só entende as coisas vivendo. Aqui não vi terreiros de candomblé. Esse é outro assunto que estou estudando. Também não vi ninguém jogando capoeira, muito menos capoeira angola. Na Bahia se vendem umas coisas que não existem, ou são totalmente diferentes da realidade. Até o kuduro venderam deturpado. Preciso entender essas coisas. Vou vivendo e tentando entender.

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Linguagens


29 de outubro de 2010

Sexta-feira, dia do homem!
O diretor hoje lançou uma roupa descontraída. Confesso que a minha expectativa era encontrar algo fora do normal. Mas ele estava low profile. Polo, jeans e tênis de treking. Tudo bem que era a camisa polo. O guarda roupa básico do cara é europeu. Falo básico no sentido real da palavra, pois o que faz a diferença no estilo do Doutor é o detalhe!!!! Camisas com gola de couro, apliques estilosos, costuras de camisas e calças com linhas coloridas e em  tons diferentes do tecido, gravatas super coloridas, cintos arrojados e por aí vai. E ele tem o maior orgulho. Disse que pode ficar sem repetir uma roupa 30 dias! Até o celular dele é invocado. Tem uma capa de couro que abre como uma agenda eletrônica. O teclado fica em um lado, o display do outro. Nunca vi daquele!!!!!
Interessante o hábito de vestir, o estilo das pessoas. Um outro diretor de instituto que deu uma palestra no nosso treinamento em Luanda sacou da pasta um notebook Sony Vaio novíssimo, cor de rosa. E ele não estava nem aí. Plugou no datashow e mandou brasa.... Aquela convenção que rosa é cor de menina e azul é cor de menino aqui não vale. Hoje mesmo tinha um aluno no instituto com mochila e tênis All Star rosa. E ele não tinha nada de afeminado.
Nos mais jovens, já percebo uma certa influência do hip hop. No vestir já dá para notar alguns elementos como os bonés “aba reta”, os tênis, óculos escuros. A questão é a proximidade do kuduro com o rap. Ambas têm trechos falados, então nada mais natural do que buscar referências americanas, por conta da mídia, que aqui é media. A sacanagem é que o rapper americano não busca influências no kuduro. Se acham esses americanos..... É natural buscar esses elementos nos ídolos made in usa, mas eu não acho que fosse necessário. Musicalmente a África é muito rica, não precisava. Mas os meios de comunicação se encarregam de misturar tudo....
Ah! É bom falar que esse kuduro que andou tocando no carnaval da Bahia é falso!!!!! Adaptaram de mais..... reinventaram o que não existe.... e não mostraram o que é o kuduro realmente. Esse estilo de música e dança, segundo meus novos colegas angolanos, nasceu nos guetos e fala das realidades, alegrias, tristezas e cotidiano das comunidades. O cenário é exatamente o mesmo do hip hop. E para quem não sabe, hip hop é um movimento e não somente um estilo de música. O movimento envolve música (rap), dança (break ou street dance), grafiti e em determinadas situações skate, basquete de rua (street basket) e por aí vai. Aliás, os angolanos são bons de basquete. São decacampeões africanos!!!! E tem alguns ídolos locais jogando na NBA.
O angolano tem uma oralidade incrível. Você conversa com jovens, adultos ou idosos e percebe que eles falam português clássico, mas com menos sotaque do que o povo de Portugal. E falam corretamente. Usam as segundas pessoas (do sigular e plural) perfeitamente. Óbvio que existem termos locais que dificultam um pouco o entendimento. E se eles falam rápido não entendemos bem. Do mesmo jeito que precisamos falar um pouco mais devagar para que eles nos compreendam. Eles também têm gírias.... todos temos...  
Hoje comentava com Armindo, o motorista da província do Uige que está conosco essa semana, que acho belíssimas as roupas tradicionais das mulheres africanas. Ele me disse que acha lindo! Senti que eles se orgulham disso. Se você já viu o Ilê Ayê passar e fica impressionado com o colorido e a forma como aquelas mulheres se vestem, aqui em Angola pode multiplicar a beleza das vestes por cem, por mil. Armindo me disse que existem muitos tecidos e cada um tem uma característica. Falou que os panos que vêm do Congo são super resistentes. Que outros são mais maleáveis e se prestam a outros usos, como as mochilas para bebês que as angolanas amarram nas costas. Incrível como as crianças dormem nessa posição! Não sei porque no Brasil não se faz isso....
Falei a Armindo que vou comprar uns tecidos para levar para minha esposa. Acho que Cissa vai curtir, para usar como canga. E se comprar aqui em Mbanza Kongo serão exclusivos!!!! Ele disse: “Não, não compre cá! Compre nas estilistas em Luanda, o fato completo professor!”. Imagine Cissa no shopping de traje angolano! Iria ficar show, mas Henrique não topa esse mico hahahahaha.
Voltando a falar sobre a oralidade, notei que alguns colegas experientes tinham razão. É extremamente comum encontrarmos pessoas que se comunicam no dialeto do norte do país, o Kikongo, quando querem privacidade. Ou de sacanagem mesmo. Hoje estava na porta do banco, chegou uma menina e perguntou algo em Kikongo ao segurança e ele respondeu em português. Se eles falassem rápido provavelmente entenderia nada, ou quase nada. Mas eles fazem isso. Ela não queria que eu entendesse. Aqui no norte todos falam a língua nacional. Mas soube que próximo a Luanda e nas cidades maiores isso está se perdendo. É uma pena.  
Alguns zairenses ainda têm nomes em Kikongo! Um professor de economia que estou ajudando se chama Mikunko. Perguntei o significado, ele disse “Em Grupo”. Como uma pessoa pode se chamar Em Grupo? Depois fui entender que é hábito batizar os filhos utilizando situações, respostas, agradecimentos, homenagens. Armindo falou que no Uige tem um amigo que se chama “Dessa Vez”. A mãe do rapaz só tinha filhas. Várias. Mas continuava tentando um garoto. E sempre falava “Dessa vez é um menino”. Tá explicado né? Quando encontrar nomes diferentes, saiba que é do dialeto, e que sempre tem uma explicação. Massa isso!!!! Tradição  indígena, adoro!!! Desde muito pequeno curto essas coisas de índio....
Os colegas que estão aqui há algum tempo dizem que os alunos adoram trabalhos que possam envolver música, dança ou representação teatral. Dão verdadeiro show. Espero vivenciar isso.
E no dia do homem, escolhi adiantar o conteúdo do meu blog, arrumar o material para a próxima semana e ler um pouco. Hoje vou começar com “O Mago, de Paulo Coelho”. 

Casual Day

28 de outubro de 2010

Hoje o dia foi quase todo destinado à montagem da estrutura de trabalho. De manhã muito entra e sai de carro. Vai na casa, no hotel, no condomínio. Até na Universidade 11 de novembro eu fui. Essa é uma universidade pública, federal, que integra um projeto maior de arrumação do país. Lá têm cursos para formação de professores do ensino fundamental e médio, além do curso de gestão de empresas. Fomos lá encontrar o empreiteiro que irá fazer a obra da casa. Ele estava na aula.
De tarde fiquei trabalhando no instituto o planejamento para o resto do ano. Sem maiores novidades até então. Mas na saída, como que uma lâmpada daquelas que aparecem em desenho animado, nasceu o post de hoje!!!! Na hora da despedida, o diretor, que dá show de produção de moda (o cara lança cada roupa massa, depois comento), falava sobre a importância e das linguagens da vestimenta em Angola.
Ele contou que de segunda a quarta, os dirigentes das instituições públicas ou privadas devem usar traje mais sóbrio, preferencialmente fato (terno). Quinta já descontrai um pouco mais, é permitido usar calça e camisa social, mas sem gravata ou paletó. E sexta? Ah, sexta é “casual day” como dizem os americanos. A roupa já pode ser mais descontraída, para os que gostam do estilo, claro. Em bancos, por exemplo, isso é muito normal. Meu professor de RH na faculdade dizia que em grandes multinacionais isso é regra.
Ok Heitor, mas para que essa ladainha toda, se isso até acontece em outros locais no Brasil e no mundo?
Porque cheguei aonde eu queria – sexta-feira em Angola é o dia do homem!!!!! Aqui é institucionalizado que na sexta, depois do trabalho, o homem pode sair, beber, e fazer tudo o que bem entender. Sem stress em casa! Sem cara feia no final de semana! Tudo dentro da maior naturalidade! As casadas aproveitam a situação para lavar e passar roupa, cozinhar ou fazer outros serviços relacionados à casa e aos filhos. As noivas e namoradas também ficam em casa. E os homens vão para o mundo.
Sexta-feira é o dia de dar atenção ou de arrumar as “catorzinhas”, como são chamadas as segundas, terceiras e por aí vai. Normalmente são meninas novas, que na falta de homem, se submetem a ter relacionamentos com homens mais velhos e comprometidos. “Prá burro velho, capim novo”, meu pai repete isso direto.... me sinto naquela novela em que Lima Duarte tinha as cabritinhas... 
Por mais curiosa que seja essa situação, e por mais que cada um de nós tenhamos conhecidos que adorariam que a regra valesse no Brasil, é bom entender que até nesse aspecto os anos de guerra continuam influenciando a vida e os comportamentos das pessoas. Demanda reprimida. A lei natural da procriação precisa ser cumprida.
Vamos ver como será a roupa do diretor hoje. Estou curioso. Se conseguir acesso, posto daqui a pouco. Caso contrário, vocês terão que aguardar até amanhã para matar a curiosidade!

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Esqueceram de mim.....


27 de outubro de 2010 

Estou coletando mais informações para poder prepar o post sobre o Candomblé em Angola. Vamos esclarecer algumas “coisitas” sobre essa temática. Mas não dava para deixar passar... A primeira noite em Mbanza Kongo (aprendi que a grafia correta é com Kappa - é assim que os angolanos chamam a letra K) foi de muita chuva e trovoada. Epahei!!! Salve Iansã!!! Deusa dos ventos e trovões. Nossa Santa Bárbara.
O calor que fazia ontem a tarde denunciava que iria chover. Mas não imaginava que seria tão rápido e com tanta intensidade. Segundo o diretor do Instituto de Administração e Gestão de Mbanza Kongo, meu local de trabalho, o período das chuvas até demorou de chegar. A cacimba, que aqui em Angola é a época das chuvas, termina em 15 de setembro. Porém ela só veio ontem. E como se diz na Bahia, “veio de com força”. Choveu tanto que hoje não teve aula! Não tinha aluno... 
Ontem tinha poeira, muita poeira. Aliás a carrinha, as bagagens e nós chegamos cobertos de poeira vermelha. O solo aqui é o mesmo massapê da Embira Branca. Igualzinho.  E hoje tinha foi lama, muita lama. Idêntica a da Embira Branca quando chove. Aquela lama liguenta. Zeca tinha uma definição muito apropriada para essa lama..... hahahahahaha. Consultem Dr. Roberto que ele explica hahahahaha. Pausa para registrar tópico para post futuro – construções com adobe.
Toda a estrutura física do instituto é de responsabilidade do governo chinês. Desde a construção, que foi feita por aqueles chineses que já citei em um post anterior, até o apetrechamento. E é um senhor apetrechamento. Não dá para acreditar que na África, em Angola, no Zaire, em Mbanza Kongo, possa existir uma condição física de trabalho daquela!!!!
Os laboratórios de informática são novíssimos e tudo é muito moderno. Só computador bala!!!! Salas de aula, de professores, gabinetes tudo é muito bom. Tem até um ginásio, que vem a ser a nossa academia, arrumadíssimo, com pesos, todos (eu disse todos!) os materiais de ginástica olímpica, tatame. Ôpa!!! Já tenho onde malhar e quem sabe puxar um treininho de Jiu Jitsu.....  Sábado vamos botar pra funcionar, pois o ginásio está fechado, cheio de teia de aranha! Tem também quadra esportiva de boa qualidade. Mas nem tudo são flores...
Pode ser que alguém mais observador tenha já comentado que estou surtando, cadê o esquecimento do título do post??
Tive um professor que repetia todas as aulas que sem leitura não há academia. O outro, dizia que não tem nada mais prático que uma bela teoria. E a teoria estános livros. Vi até o filho desse professor agorinha em Passione, cantando em italiano.... O grande problema do instituto é a biblioteca. Ou melhor, o que deveria existir dentro dela e não existe. Livros. Aqui eles são caros demais. E quem escreveu esse projeto que espalhou por todo o país 34 institutos exatamente iguais, não contemplou a aquisição de livros.
Aqueles que trouxeram livros, como foi o meu caso, rapidamente se sensibilizam e decidem doar o material depois de realizar o trabalho. Como trouxe uma mala cheia deles, em dezembro a biblioteca ganhará alguns exemplares. E se voltar, trarei outros. Acho que é o mínimo que posso fazer por jovens que querem mudar de vida e crescer junto com o seu país.
E aí o jeitinho brasileiro faz a diferença! Vamos nos virando como podemos! Felizmente, hoje é possível fazer download de muitos títulos na internet. Alguns colegas trouxeram muitos e-books técnicos do Brasil. Decidimos que a primeira atividade nossa será a montagem de um acervo digital, o que já é um grande passo, para quem não tem nenhuma referência. O diretor cedeu dois computadores para servirem de “depósito” desses e-books e outros materiais digitais, como slides de aula e fascículos (é assim que os angolanos chamam as apostilas). Ah, só para clarear, quando digo nós, me refiro aos três professores brasileiros do instituto - Cleber, Henrique e eu.  Vamos começar a fazer isso amanhã.

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Se você não sai de Luanda, não tem emoção!

26 de outubro de 2010

Saí de Luanda 5:30h, ainda estava escuro. Mbanza Congo, here we GO!!!! A saída de Luanda foi bem tranquila, a estrada é muito boa. Como era cedo, não tinha engarrafamento. Depois de rodarmos cerca de 2 horas, o asfalto acabou e iniciamos um longo, mas muito longo trecho de estrada de barro. Algumas vezes dava para transitar a 80 km/h mesmo com piso de barro. Mas em outras situações foi preciso engatar a primeira. Poeira, muita poeira. Só depois fui entender porque o plano de nos mandar a Mbanza Congo em um Toyota Avanza, van de 7 lugares muito comum aqui em Angola. Aquele carro bem espaçoso e confortável é muito baixo para a quantidade de buracos no trecho. Por isso, inauguramos uma Toyota Hylux 4 x 4 novinha. Deu pena. Mas a carrinha é caceteira!!!!
A bagagem veio misturada com as compras. Ficamos com receio do que iriamos encontrar (ou não iriamos) e decidimos fazer um mercado de sobrevivência. Água mineral, muita água mineral. E outras coisas para sobreviver caso o bicho pegasse. Além de malas e compras, a carrinha veio entupida de coisas para a nossa casa. Camas, armários, um monte de tralha. Aqui em Angola não se equipa casa, se apetrecha.
Foram ao todo 10:30h de viagem. Cansativo demais, porém a paisagem, o novo e o desconhecido foram aditivos que garantiram a chegada a Mbanza Congo. Só na estrada, de dentro do carro, vi macacos, esquilos, muitos pássaros que depois soube serem corvos, muita gente vendendo carne de caça. Das mais variadas. De veado, porco do mato, macaco. Vi também a Galinha de Angola Selvagem, que aqui chama galinha do mato. E custa 100 dolares. A carne dela aqui é apreciadíssima. E eu cresci ouvindo que não se come coquém porque tem gosto de formiga. Ah Seu Aristóbulo!!!!!!
Detalhe – saindo do estado de Luanda, atravessamos o estado do Bengo até chegar ao Zaire. Mbanza Congo é a capital da província. Nos perdemos no caminho e gastamos 40 minutos a mais. Mas deu certo! Chegamos!!!!
Tenho que confessar que a minha primeira impressão sobre a cidade foi muito ruim. Uma pobreza enorme, gente morando em condições horrorosas. Um negócio muito desordenado. A guerra acabou com essas bandas de cá.
Porém, para a minha grata surpresa, Mbanza Congo é bonitinha!!!! Depois fui entender que a  entrada da cidade é pela periferia. O centro da cidade é bem organizao. Tem 3 agências bancárias, uma loja Nosso Super (rede nacional de supermercados), hotel, e toda a estrutura administrativa da província, inclusive a casa e o gabinete do governador.
Vou morar inicialmente no Hotel Estrela do Congo. Não é nenhum cinco estrelas, mas dá para ficar na boa! Esperava coisa pior. Estava preparado. A casa que a empresa alugou está em reforma e provavelmente não fica pronta nos próximos 15 dias. O telefone celular funciona bem aqui, tanto os da Movicel como os da Unitel. O Movinet, modem da Movicel para acesso à internet funciona, porém lento. Lembrei da internet discada.... espero que essa velocidade não seja a usual.
Jantei no hotel. A lagosta é o prato mais barato aqui cunhada!!!!!! Você estava certa!!! 1200 kwansas, uns 10 dólares, 17 reais!!!!! Vou me dar bem aqui, estou sentindo!!!! Mas não tinha lagosta..... Comi bacalhau. Estava salgado, pois você precisa avisar no hotel na hora do café que irá jantar para que o pessoal da cozinha se programe. Avisei 17h quando chegamos. E o bicho ficou pouco na água, não deu para tirar o sal.....
Vou falar com Cissa e Henrique e dormir. Pai, mãe, tá tudo bem aqui viu. Fiquem em paz!
Amanhã é dia de trabalhar!!!!!

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Alambamento

25 de outubro de 2010
O post de hoje é diferente. Como soube que tem gente chorando, e esse não é o propósito do diretodeangola, vamos abordar um tema polêmico – a relação homem X mulher. Em Angola, claro. E lembrem que o post é meu, a regra é minha.
Antes de sair do Brasil ouvi muita conversa, que o angolano é machista, que as mulheres aqui são muito inferiorizadas... vamos tentar entender um pouco o contexto e vai ficar mais fácil explicar algumas coisas.
Primeiro é importante que todos saibam que o país só tem 35 anos de emancipação. A festa maior deles é dia 11 de novembro, dia da independência. A cidade de Luanda já está se preparando para esse momento. O clima festivo está instalado. Só que esse processo de romper com Portugal foi muito amarrado. E a guerra terminou há muito pouco tempo.
Quem vai a guerra é o homem. E nesses conflitos muitos deles morrem. Aí começamos a perceber uma lei da economia (oferta e procura), que gera uma situação chamada pelo marketing de demanda reprimida. Se falta homem no mercado, o produto passa a ser supervalorizado. E aqui isso é muito sério.
Se faltam homens, teoricamente, sobram mulheres, correto¿ Errado!!! Os angolanos, contrariando as teorias mercadológicas, se aproveitam das prateleiras cheias de mulheres e arrumam várias!!!!!! E com elas têm muitos filhos. É comum aqui os caras terem mais de 30 filhos. Com 7, 8 mulheres. E elas não se importam. Naturalmente, são permissivas com essa inferiorização. Não lembro se já comentei isso, mas aqui casais não andam de mãos dadas, pois pode ser constrangimento se encontrarem a outra, ou outras.
Aqui, quando um rapaz deseja engatar um relacionamento sério, prá casar, ele precisa fazer um “alambamento” antes de noivar. Alambar significa dar demonstrações materiais de que suas intenções são positivas. Ele presenteia o pai da noiva com um fato (terno), a família com vinhos, paga muitas rodadas de cerveja para os irmãos, tios, brinquedos para as crianças, e quando vai noivar tem que ter uma carta de pedido de noivado, que vai em um envelope, com dinheiro dentro! Os mais ricos podem fazer alambamento várias vezes, semo problema!
Agora veja que negócio. O cara faz isso tudo, mas a noiva é o que menos importa. Aliás eles dizem que a esposa não pode e não deve ficar muito bonita, cuidada. Pode chamar a atenção, os outros vão olhar, ela pode gostar dos elogios e aí já era. O alambamento vai por água abaixo, ele tem um prejuízo financeiro enorme. A honra da família dele é toda ferida, até a primeira geração. Uma mulher de 30 anos aqui é acabada, já teve vários filhos e aparenta 60. Vale lembrar que a expectativa de vida em Angola é 42 anos.
Por isso, xingar “puta que pariu” aqui é muito, mas muito pesado. Eles entendem (e sentem no bolso) que todo o dinheiro da família foi investido em uma puta.
Que contraste com a cultura indiana, a gipsy e com a minha também! Acho que a mulher tem que estar bonita, bem cuidada. Já eles defendem que a mulher deve passar despercebida.
Comentários, por favor.
ATENÇÃO – Amanhã viajo para Mbanza Congo, meu local de trabalho nesses próximos meses. Vamos de carro, e é um pouco distante. O post de amanhã vai ficar para quarta.

domingo, 24 de outubro de 2010

Terapias

24 de outubro de 2010
Ontem fui dormir feliz. O meu Bahêa ganhou de goleada do Asa de Arapiraca e segue forte para a primeira divisão. Rick ficou eufórico, com toda certeza. Apesar de que Cissa disse que levou ele ao shopping com a galera da escola...  tá de treta....
Acordei tarde. Mas bem disposto. Fui dar a minha primeira corrida em solo africano. Aí era inevitável lembrar de Alexandre Huang, o “Monstro”, treinador da Marathon Club, o meu grupo de corrida. Fiquei pensando como seria se pudesse captar energias dos grandes corredores africanos, ou até mesmo dos animais selvagens super velozes que moram por aqui. Como seria bom passar voando pelos colegas mais rápidos do grupo e dizer “tchau!”. Sonhar é bom porque não pagamos nada.... Mas o treininho foi legal, 45 minutos. Estava e está quente, igual a Salvador. Monstro, a idéia é chegar aí fininho. Robinson, me aguarde....
Saindo para o meu primeiro treino africano. Go Marathon!
Dizem que quem corre não precisa de terapeuta. Acredito nisso. E hoje já fiz a minha sessão. Vi muitos pardais. E aí é inevitável lembrar das tantas vezes que ouvi meu pai repetir histórias desse passarinho quase onipresente. Meu pai tem várias dessas histórias. Ele conta que Aurino (nosso funcionário dinossauro lá do Pau D´Arco) diz que ninguém pode assistir à missa na igreja de Olindina por causa dos pardais. Eles fazem cocô lá de cima, sujam tudo. As beatas não têm mais direito de participar do culto. O padre teve que fechar as portas do templo.
Meu avô Heitor, pra variar, dizia que não existiam pardais no Brasil e que os portugueses fizeram o favor de importar esses bichinhos. E meu pai conta que o avô dele, o “Biso”, amante da natureza, ficava chateado porque os pardais espantavam todos os pássaros nativos. Principalmente os cantores. Já que estamos a falar de animais de pena, depois de uma semana em Angola, finalmente vi uma Galinha de Angola!!!! O nosso coquém, ou tô fraco. Pensei que galinha de Angola era mais uma lenda brasileira, assim como a do candomblé. Opa, esse é um assunto que demanda um post específico.
Vi também pássaros diferentes, bem parecidos com canários da terra, só que azuis. Muito bonitos. Devem ser primos. Vi garças também. Tudo aqui na vizinhança, no bairro chamado Projecto Nova Vida.
Como corri pelo bairro, vi algumas casas com cachorros. E percebi que as pessoas curtem Boxers por aqui. Lembrei de Diamond e Angra, ancestrais de toda uma geração desses cachorros que só tem aparência de mal. São verdadeiros bebês gigantes. E aí vejam como um pensamento puxa outro. Ontem quando postei fotos no Orkut, Lisco, um velho conhecido da Cidade Baixa mandou um recado quase que online, dizendo que na Ribeira tem um cara que tem um Mustang GT. Ninguém merece Bienal! E ele era apaixonado por Diamond. Assoviava lá da casa dele e Diamond ficava alucinado no canil. Esses dois personagens têm muitas histórias. Papo para outro post.
Lembrei de Chang. Cissa, Henrique e todos os humanos sabem que dei uma saída, mas volto. Mas o que será que ele está pensando? Cissa disse que ele ficou triste essa semana. Não quero tristeza nem na minha casa e nem na de ninguém daí do Brasil. Pedi e peço sempre para darem atividade a ele. Por favor, botem ele para suar!!!!!
Lembrei da galera lá da fazenda, a velha guarda em especial. Os nossos vaqueiros, já desencarnados Zeca e Arthur diziam que quando a coruja “mija” no olho de qualquer planta, não tem essa que fique viva. E vi até um corujão uma noite dessas. Lembrei de Henrique na sua fase Harry Potter. Edwiges. Falei dessa história da coruja porque percebi que em Angola, em particular aqui em Luanda, muitas casas têm uma poda nas árvores interessante. Eles cortam o “olho” da planta, que engrossa no caule e fica com galhos desproporcionais, bem mais finos. Bonsais gigantes? Opa, outro post em vista, o dos Baobás. Em breve.
Hoje é domingo. Permitam que eu me alongue. Terapia.
Vi um monte de chineses que trabalham na construção civil. Domingo, quase meio dia, os caras estavam a todo vapor levantando casas. Todos esses caras têm problema com a justiça, cometeram crimes leves e a pena é convertida em trabalho. Em Angola. Ganham 300 dólares por mês e trabalham pesado, 15, 16 horas por dia. Lembrei de minha mãe. “Miséria atrai miséria”. Moram em containers em situação que dá pena. Mas o que será que esses caras fizeram para estarem passando por isso? Vou me aprofundar nessa parceria China-Angola e quem sabe não proponho uma solução parecida para a nossa população carcerária? Polêmico isso....
Rapaz tudo isso foi correndo! Correr é uma terapia. Obrigado Marathon Club. Obrigado Monstro! Por enquanto não vou precisar ir ao terapeuta.
Vou almoçar aqui na casa mesmo. Rolou uma “vaquinha” para fazer uma macarronada. Tô firme na dieta, evitando o glúten. Eu disse evitando! Mas hoje é domingo. Amanhã eu compenso e fica tudo certo.
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A macarronada não estava lá essas coisas.... aliás, estava horrível.... meu Vô Ferrari não me perdoaria. Mas estou na África, deixa para lá!
Depois do almoço, fomos ver a praia de Luanda. Rapaz, a Ribeira e o Canta Galo dia de domingo perdem feio!!! A galera daqui curte mesmo. É carro na praia, muita música, dança, churrasco, cerveja. Reggae monstro!! Pesadão mesmo. Mas tudo na paz. O povo de Angola é feliz, faz festa mesmo. Apesar de tanta muvuca, não se vê confusão. Mas o povo faz xixi na rua, igualzinho a Salvador!
O motorista de hoje foi Otávio, vulgo Jacaré. O cara parece muito com o dançarino e dublê de humorista brasileiro. Um bom humor incrível. E acho que faz piada melhor do que a sua versão brasileira. Jacaré passou depois o comando da viatura para Fidel, mais humorado ainda. Decidi fazer um post futuro para falar da equipa (com A mesmo) de motoristas. Com tempo vou juntando as histórias desses caras.
Fidel nos levou em um local massa, chamado Caribe, na praia do Éden. É uma mistura de barraca de praia e restaurante. Boa comida!!! Finalmente! Muito legal. E não é caro. Boa opção para quem vem a Luanda. Próximo ao Caribe tem um Bob´s, um restaurante chic chamado Eldorado e uma discoteca (não pode falar boate! Boate aqui é brega!) chamada Éden. Caribe, recomendado pelo diretodeangola.blogspot.com.
Bebi uma cerveja nacional chamada Cuca. Duas longnecks, para ser mais preciso. Que cerveja forte!!!!! Fidel falou que a sigla Cuca significa “cairam uns caras aqui!”. E não tinha EKA e nem Ngola, as outras duas nacionais. Se tivesse iria experimentar. Os cervejeiros de coração foram todos invocados agora de tarde. Meu pai, tio Carlinhos, Sogra coral, Henricão, meu cumpadi e kimosabe Beto, tia Keni Panda, a galera da fazenda. Hoje também imaginei como seria a turma da casa de Cissa no Caribe. Digo, na barraca Caribe hehehe. Kau na empolgação querendo experimentar tanta coisa diferente para comer e beber. Depois fica com sono. Verônica só no copinho. Thabata rindo de tudo que é besteira e com seu inseparável iphone. Carlinhos em alta, só na Cuca. Ou na Eka.... Bala totalmente sem noção dizendo que odeeeeeia cerveja forte. Iria ser massa. Sem contar que o nosso tira-gosto brasileiro aqui é chamado pica-pau! Na lógica, o ato mecânico de pegar com o palito o petisco é a repetição do movimento de um pica-pau mesmo. Adorei isso!
Ói ela!
EEEEEEEKA!!!!
Molhei os pés no meu velho conhecido, o Oceano Atlântico. Odoyá. Saudei e pedi licença a Yemanjá, como sempre faço quando entro no mar. Atlântico. Lindo, imponente, majestoso. Estranha essa coisa de ter justamente o meu eterno playground funcionando como um muro que me separa da minha terra. Mas foi bom olhar para o horizonte e saber que fiquei mais perto de todos que amo. Literalmente. Na mente, no coração, na distância. Cantei. “Quando bate a saudade vou pro mar, fecho os meus olhos e sinto você chegar”.    
 Como estou do outro lado, naturalmente aqui o sol funciona ao contrário. No Brasil nasce no mar, em Angola se põe no mar. Não interessa de que lado, o Atlântico é a minha igreja, o meu playground, meu retiro. Estamos juntos. Sempre.
O sol caindo lá no Bahia! Do lado de lá...



The ocean is my playground. 


sábado, 23 de outubro de 2010

Batizado no trânsito

22 de outubro de 2010
Finalizamos o treinamento. O almoço foi no Belas e fui a um instituto em Kilamba Kiaxi. A noite, tentativa de churrasco na casa do chefe, que tá servindo de albergue para os colegas que chegaram uma semana antes. O pessoal começa a ser distribuído para as províncias no sábado, amanhã. Tentativa de fazer um evento para fechar o treinamento e desejar boa sorte para todos.
A noite fui na Emirais, uma academia enorme daqui. Acho que a melhor e maior. Fui, visitar a Roger Gracie Academy Angola. Prá quem não conhece, Roger Gracie é um dos lutadores de Jiu Jitsu mais vencedores de todos os tempos. Roger é um competidor diferenciado, técnico, finalizador. Não luta para fazer pontos, luta para finalizar. E vem fazendo um trabalho muito legal de expansão da sua academia, que tem sede em Londres. O responsável pela RGA Angola é Sensei Hélio, um angolano gente fina, que dá aulas de Jiu Jitsu em dois espaços em Luanda. A Emirais fica na rua onde estou hospedado. Assim é fácil treinar...  Na academia tem americano, libanês, português, angolano, pernambucano, paranaense, cearense. Dei um treino com a rapaziada lá. Muito bom!!! Jiu Jitsu de primeira! Na melhor escola da Arte Suave do mundo, a Gracie Jiu Jitsu!!!! 
Depois do treino na Roger Gracie Academy - Angola

  23 de outubro
Acordei e fui ao centro de Luanda, tentar fazer uma remessa de valor para o Brasil. Hoje foi o dia de conhecer o trânsito de Luanda. Até então tinha ficado preso no engarrafamento, mas em pequenos trechos. Hoje foi a estréia. Três horas para vencer menos de 20 Km até o centro. Lembrei da meia maratona do Rio. Se fosse correndo chegava antes. Não muito. Mas chegava.
Fiz um cadastro na Real Transfer, o que vai facilitar bastante o envio de dinheiro para o Brasil. Não sei se no Zaire tem, mas em Luanda funcionou e foi bem simples. Voltei para Nova Vida, onde fica a casa de passagem da empresa. Almoço no Belas e aproveitei para fazer umas compras no Shoprite, supermercado legal lá do shopping.
Hoje aprendi que aqui ônibus é auto-carro. Garupa de moto é pendura. Mototaxi é cupapatas. Agora você imagine, as bibas de Pojuca andando todas de Cupapatas...... hahaha muito engraçadas essas diferenças na língua. Van é candonga. Hoje as curiosidades da língua foram basicamente sobre trânsito. Basicamente.
Isso porque falei que ficamos presos no trânsito três horas. Era natural que com tanto carro, moto (que aqui é mota), ônibus, van, gente pela rua, a conversa girasse muito em torno disso. Só que teve um detalhe...
O presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, fez um discurso esses dias na Assembleia e isso motivou o MPLA (seu partido) a mobilizar um mundo de gente para fazer um movimento tipo passeata, para demonstrar apoio ao discurso dele. Apoio ao discurso, nunca vi isso. Nosso carro ficou barrado e fomos obrigados a assistir a manifestação todinha. Até o final. Gente que não acabava mais. Ver as mulheres da OMA (Organização das Mulheres Angolanas) em seus trajes marcantes e com o típico lenço amarelo na cabeça foi bem forte. Principalmente porque muitas delas carregavam bebês nas costas, amarrados por um pano. Isso aqui é muito comum. Como se fosse um canguru ao contrário. Isso aqui tem demais. E eles dormem que é uma beleza nessa posição de mochila...  
Nem precisa dizer que lembrei de Cissa. Fiz as minhas comparações desse movimento político com nossas vivências na área.... Deus é mais. Mas isso vai acabar, ah vai! Lembrei de Ney. Impossível ver aquela militância apaixonada e não linkar imediatamente com meu amigo de trincheira.
Mas foi bonito ver essa manifestação de amor pelo presidente. Aqui, ele é o cara... anos no poder... 
 
Muçulmanos apoiando o presidente

Delegação MPLA de Viana, município de Luanda
Hoje lembrei de mais alguns personagens. De uns lembrei enquanto conversava com Cissa pela net. Vamos lá....  
Esses dias todos tenho lembrado do meu sogro, o velho Clarindo. Na verdade penso nele sempre que vejo como aqui existem diferenças sociais. Meu sogro é um cara simples (até demais), mas tem um coração de cavaleiro. Veio a esse mundo para servir e tem uma sensibilidade enorme em relação às questões sociais incrível. Para não dizer que não falei da velha, lembrei dela HOJE, quando vi uma propaganda de uma cerveja local chamada ECA. Imaginem a Sogra Coral bebendo uma cervejinha chamada Eca.... “que merda de cerveja, merda de Eca!”
Já que estamos falando daa velha guarda, lembrei e falei de meu Vô Ferrari e de minha Vó Carminha. Encontrei um pernambucano hoje no carro, disse a ele que meu avô jogou no Sport. E o cara falou que jogou na divisão de base do rubro negro pernambucano também. Foi goleiro. E o cara fala como minha Vó, que mesmo depois de tantos anos na Bahia, ainda deixa escapar um “tumate”, uma “tumada”.
Mas agora queria falar um pouco sobre meu Vô Heitor. Apesar do amor incondicional que Vó Nancy tinha por mim (e não fazia a mínima questão de esconder de ninguém) eu tive e tenho uma ligação muito forte com o velho Heitor Marback. Tinha com ela também. Mas o velho era demais!!!!Dividimos muitos momentos legais. Vivi instantes únicos com ele. Admiro demais o meu avô. Aliás, eu só não, acho que ele é um dos caras mais amados que tenho conhecimento.
Logo de cara, quando vejo as diferenças absurdas entre ricos e pobres, e os malabarismos do comércio informal de Angola, onde se vende de tudo, na rua, lembro que ele ficava sempre muito intrigado com as mais variadas formas de se ganhar a vida. Penso nele todos os dias. E acho que irei continuar pensando. As diferenças aqui são gritantes. Mas a galera se vira!
Meu Vô Heitor era um cara muito culto. E tinha uma simpatia enorme por Portugal e suas coisas. Inclusive tinha amigos portugueses. Visitar o centro de Luanda hoje foi muito bom, vi construções em estilo europeu. E lá, a influência de Portugal está em todos os prédios mais antigos. Lembrei que meu avô sempre comentava sobre as origens das mais variadas coisas e hábitos, inclusive as mais esquisitas e dizia “isso veio de Portugal”. Acho até que quando perguntávamos sobre alguma coisa ou costume e ele não sabia, dizia logo: “veio de Portugal”.
As angolanas têm bunda grande. Algumas até demais. Uma vez, pegando uma carona com meu avô para ir a aula, passou uma mulata da bundona, e ele com toda a sua educação e sagacidade falou “quanta abundância meu filho!”. Impossível não lembrar dele aqui.
Vou parando por aqui. Vou ouvir o meu Bahia dar uma porrada no Asa de Arapiraca. Bora Bahêa!!!!!! Aí é crueldade... Não tem como não lembrar de Henrique e sua paixão desmedida pelo tricolor de aço.... vamos subir esquadrão!!!!!!!!